Na defesa da participação do povo pobre no orçamento, Lula chora ao falar sobre combate à fome
“Eu quero repetir para vocês que, quando eu terminar esse mandato, se cada brasileiro tiver tomando café, almoçando, jantando outra vez, eu terei cumprido a missão da minha vida”, declarou em sua primeira ida à sede da transição de governo, em Brasília
Publicado 10/11/2022 - 14h37
São Paulo – O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), defendeu nesta quinta-feira (10) um “novo paradigma de funcionamento” no Brasil, em que a questão social e a população mais pobre sejam centrais para a tomada de decisões dos poderes. Em um discurso dirigido aos deputados e senadores que defenderam sua candidatura, Lula observou que sua eleição foi garantida pelo voto daqueles que “acreditam que, embora a gente tenha que governar para todos, temos que tratar prioritariamente as pessoas mais necessitadas”, justificou, sugerindo mudanças no mundo do trabalho e na condução econômica.
“Ora, por que as pessoas são levadas a sofrerem para garantir a tal da estabilidade fiscal nesse país? (…) Por que as mesmas pessoas que discutem o teto de gasto não discutem com seriedade a questão social desse país? Por que o povo pobre não está na planilha da macroeconomia? Por que temos meta de inflação e não temos meta de crescimento? Por que não estabelecemos um novo paradigma de funcionamento nesse país?”, provocou Lula.
A chamada “questão social” pautou boa parte do discurso feito pelo presidente eleito durante reunião que marcou ainda sua primeira visita ao centro de transição de seu governo no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), de Brasília. Numa fala alinhada com as promessas de campanha e de seus interlocutores neste processo de alternância de mandatos, Lula voltou a se emocionar ao destacar seu compromisso de combate à fome no país.
Combate à fome
Ele também repetiu que a prioridade de seu terceiro mandato será “outra vez restabelecer a dignidade do nosso povo”. “Não tenho que mudar uma única palavra. Eu quero repetir para vocês que, quando eu terminar esse mandato, se cada brasileiro tiver tomando café, almoçando, jantando outra vez, eu terei cumprido a missão da minha vida”, declarou, chorando.
Ao retomar a palavra, Lula acrescentou que jamais esperava que a fome voltasse ao país. “Quando eu deixei a Presidência, eu imaginava que nos 10 anos seguintes esse Brasil estaria igual a França, a Inglaterra, teria evoluído do ponto de vista das conquistas sociais”, lamentou. O presidente também elencou os processos históricos dos últimos seis anos, do golpe contra a ex-presidenta Dilma Rousseff (PT), à sua prisão para tirá-lo do processo eleitoral ao governo Bolsonaro.
Lula ponderou, contudo, que sua eleição, marcou o retorno da democracia brasileira. O petista também confirmou que deve buscar uma ampla base aliada no Congresso, ao comentar sobre seu encontro nesta quarta (10) com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), aliado do atual chefe do Executivo. “Eu não enxergo dentro da Câmara e do Senado essa coisa do centrão. Eu enxergo deputados que foram eleitos e que, portanto, vamos ter que conversar com eles para garantir as coisas que serão necessárias para melhorar a vida do povo brasileiro”, disse.
Gasto ou investimento?
Por outro lado, o presidente eleito prometeu que também governará em diálogo com os movimentos sociais e os segmentos populares brasileiros. “Nosso compromisso é muito simples, é reconstruir nosso país. A democracia está de volta, a civilidade está de volta. O povo vai ser ouvido, terá o direito de dar palpite naquilo que temos que fazer. As empresas públicas serão respeitadas. A Petrobras não vai ser fatiada, o Banco do Brasil não será privatizado. A Caixa e o BNDES voltarão a ser banco de investimento, inclusive para pequenos e médios empreendedores”, seguiu Lula.
Na mesma linha, ele também defendeu mudar conceitos considerados como “gastos” para “investimentos”. “Não é possível que tenham cortado a Farmácia Popular em nome de que é preciso cumprir a meta fiscal, a regra de ouro. A regra de ouro nesse país é garantir que nenhuma criança durma sem tomar um copo de leite e acorde sem um pão com manteiga para comer todo o dia. Essa é nossa regra de ouro. É o compromisso de fazer com que esse país maravilhoso tenha o povo voltando a sorrir”, ressaltou Lula.
Transição
No mesmo discurso, o petista destacou que o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB) não será ministro do futuro governo, amenizando os ânimos da imprensa em torno dos nomes dos futuros chefes de gabinete. O ex-governador de São Paulo vem coordenando a equipe de transição que, nesta semana, foi dividida em 31 grupos técnicos. De acordo com Lula, o grupo atuará para fazer um levantamento da situação do país. As decisões de governo serão tomadas a partir desse diagnóstico.
Ele também destacou aos aliados, que os deputados e senadores que perderam a reeleição também farão parte do processo de transição.
Papel das Forças Armadas
Ao comentar sobre o resultado eleitoral, Lula também cobrou respeito e reconhecimento da derrota por parte do presidente derrotado. “Democracia é isso, um ri e outro chora”, resumiu. Ele ainda completou que Bolsonaro deveria pedir desculpas às Forças Armadas por ter usado os militares no processo contra as urnas eletrônicas, envolto em acusações mentirosas e sem provas.
A pá de cal, segundo Lula, foi o relatório produzido pela equipe técnica das Forças Armadas, entregue nesta quarta pelo Ministério da Defesa, confirmando a segurança do processo eleitoral. “Ontem aconteceu uma coisa humilhante, deplorável para as nossas Forças Armadas. Um presidente da República, que é chefe supremo das Forças Armadas, não tinha o direito de envolver as Forças Armadas a fazer uma comissão para investigar urnas eletrônicas, coisas que são da sociedade civil, dos partidos políticos e do Congresso Nacional”, disparou o presidente eleito.
“O resultado foi humilhante, humilhante. Eu não sei se o presidente está doente, mas ele tem obrigação de vir à televisão e pedir desculpas para a sociedade brasileira e pedir desculpas às Forças Armadas, por ter usados as Forças Armadas, que é uma instituição série, que é uma garantia para o povo brasileiro contra possíveis inimigos externos, fosse humilhada, apresentando um relatório que nada diz, nada,absolutamente nada daquilo que ele durante tanto tempo acusou”, advertiu.
COP 27 e Copa do Mundo
Como esperado, Lula anunciou que aceitou o convite para participar da 27ª Conferência Climática da Organização das Nações Unidas (ONU), a COP27. Ele embarca na próxima segunda-feira (14) para Sharm El Sheikh, no Egito, onde ocorre o evento.
Ao comentar a agenda, o presidente eleito ainda provocou Bolsonaro,causando risadas na plateia, afirmando que “em um único dia conversará com mais lideranças do que Bolsonaro conversou em quatro anos”. “Uma das coisas que vamos fazer é recolocar o Brasil no centro da política internacional. Vocês não têm noção da expectativa que o Brasil está gerando no mundo. A expectativa é tão grande que o Putin ligou (o presidente da Rússia, Vladimir Putin); o Zelensky ligou (o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky). Em um único dia recebi 26 telefonemas, coisa que o Bolsonaro talvez não tenha recebido em nenhum dia”, confidenciou Lula.
A reunião já havia encerrado, quando o presidente eleito voltou a se dirigir para os aliados, pedindo que a camiseta da seleção brasileira de futebol seja usada na Copa do Mundo, que começa no próximo dia 20. A peça passou a ser associada a apoiadores do atual presidente, que sequestraram o símbolo nacional. “A gente não tem que ter vergonha de vestir a nossa camisa verde e amarela. O verde e amarelo não é de candidato ou de partido. O verde e amarelo são as cores para 213 milhões de habitantes que amam esse país. Portanto, vocês vão me ver com a camiseta verde e amarela, só que a minha terá o número 13”, brincou Lula.